Viajantes Interplanetários

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Papo de malandro

Na década de 50, o malandro carioca “Zé da Ilha” prestou o seguinte depoimento à polícia: “Seu doutor, o patuá é o seguinte: Depois de um gelo da coitadinha resolvi esquinar e caçar uma outra cabrocha que preparasse a marmita e amarrotasse o meu linho no sabão.

Quando bordejava pelas vias, abasteci a caveira e troquei por centavos um embrulhador. Quando então vi as novas do embrulhador, plantado como um poste bem na quebrada da  rua, veio uma paraquedas se abrindo, eu dei a dica, ela bolou, eu fiz a pista, colei; solei,  ela aí bronqueou, eu chutei, bronqueou mas foi na despista, porque, muito vivaldina, tinha se adernado e visto que o cargueiro estava lhe comboiando.

Morando na jogada, o Zezinho aqui ficou ao largo e viu quando o cargueiro jogou a  amarração dando a maior sugesta na recortada. Manobrei e procurei engrupir o pagante,  mas, sem esperar, recebi um cataplum no pé do ouvido.

Aí dei-lhe um bico com o pisante na altura da dobradiça, uma muqueada nos mordedores e taquei-lhe os dois pés na caixa de mudança pondo-o por terra. Ele se coçou, sacou a máquina e queimou duas espoletas. Papai, muito esperto, virou pulga e fez a dunquerque, pois o vermelho não combina com  a cor do meu linho. Uns e outros me disseram que o sueco era tira e que iria me fechar o paletó. Não tenho vocação pra presunto e corri.

Peguei uma borracha grande e saltei no fim do carretel, bem no vazio da Lapa, precisamente às 15 para a cor ­de ­rosa. Como desde a matina não tinha engolido a gordura, o roque do meu pandeiro estava 
sugerindo sarro. Entrei no china-pau e pedi um boi a mossoró com confete de casamento e uma barriguda bem morta. Engoli a gororoba e como o meu era nenhum, pedi ao caixa pra botar na pendura que  depois eu iria esquentar aquela fria. Ia pirar quando o sueco apareceu. Dizendo que eu era produto do Mangue, foi direto ao  médico-legal para me esculachar. Eu sou preto mas não sou Gato Félix, me queimei e puxei a solingen. Fiz uma avenida na epiderme do moço. Ele virou logo América. Aproveitei a confusa para me pirar, mas um dedo-duro me apontou aos xifópagos e por isto estou aqui.”



 Fonte

QUADROS, Jânio. Curso prático de língua portuguesa e sua literatura. São Paulo: Formar, 1966.

2 comentários:

  1. FLORDOLÁCIO
    A tal inculta e bela continua viva
    Vive ela da interpretação popular
    Não é estática, nunca será cativa
    E molda-se às maneiras do falar

    Quem está nas ruas faz o idioma
    Depois é registrado no dicionário
    Não é inseto preso numa redoma
    Em exposição dentro do armário

    Falemos, depois façamos a regra
    Porquanto o idioma quer ser assim
    Palavra nasce e filólogo a integra

    E gramática expõe tintim por tintim
    Então a língua exultante se alegra
    Em constante mudar que não tem fim.

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